O ritmo é semelhante, mas a composição do crescimento é muito diferente entre os dois anos.
O consumo das famílias garantiu à demanda interna neste início de ano
um crescimento semelhante ao do começo de 2011. No primeiro trimestre
daquele ano, o consumo das famílias e os investimentos aumentaram a um
ritmo anual de 2,7%. Nos primeiros três meses de 2012, essa taxa ficou
entre 2% e 2,5%, segundo cálculos da LCA Consultores, que projeta os
resultados trimestrais do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro para o
período de um ano.
O ritmo é semelhante, mas a composição do crescimento é muito
diferente entre os dois anos. Enquanto nos primeiros três meses de 2011 o
investimento aumentou mais que o dobro do consumo das famílias, no
mesmo período deste ano, de acordo com a LCA, os gastos com máquinas,
equipamentos e em construção recuou, enquanto a demanda das famílias
ficou próxima ao 0,5% de alta registrado no início de 2011.
A expectativa da consultoria é de que o ritmo anual de expansão da
demanda interna salte para algo entre 5% e 6% no segundo trimestre deste
ano, se aproximando dos 6,7% registrados nos três últimos meses de
2010, época em que o governo começou a tomar medidas para esfriar a
economia após ter constatado que havia estimulado demais o país para
sair da crise financeira mundial de 2009.
Esse avanço brusco da demanda interna, porém, não preocupa o
economista-chefe da LCA, Bráulio Borges. Segundo ele, no primeiro
trimestre de 2012, o PIB ainda vai ser puxado pelo consumo das famílias,
mas a partir do segundo trimestre haverá uma mudança na composição da
demanda interna, com uma forte recuperação dos investimentos. A
estimativa da LCA é que o investimento recue 0,7% no primeiro trimestre e
depois cresça 3% no segundo, sempre considerando a comparação com o
trimestre anterior e feito o ajuste sazonal. "Daí pra frente, o
crescimento do Brasil vai ser puxado por investimentos. Consumo terá uma
participação menor", diz Borges.
Em sua avaliação, o consumo das famílias também continuará
crescendo, mas em menor intensidade que a formação bruta de capital
fixo. Ele projeta 0,6% no primeiro trimestre e 1% no segundo, sempre na
comparação com os três meses anteriores. É devido a essa previsão de
mudança na composição do crescimento do país que Borges não vê o risco
de a economia passar por uma nova fase de aquecimento exagerado. "Temos
uma ociosidade na economia que ainda não foi absorvida. Por isso é
possível crescer sem gerar inflação", diz.
Essa visão, porém, não é consenso. A Fundação Getulio Vargas (FGV) e
a Tendências Consultoria estão entre as instituições que consideram
possível um crescimento muito intenso da demanda interna ainda este ano.
"O consumo das famílias está aumentando mais rápido do que deveria. Se
continuar assim, o governo vai ser obrigado a novamente colocar o pé no
freio lá na frente", afirma a economista da FGV, Silvia Matos.
O que preocupa a economista Alessandra Ribeiro, da Tendências, é o
descompasso. "O ideal seria o governo tentar frear o consumo e aumentar o
investimento, para ampliar a capacidade produtiva. Mas o que vem
acontecendo é exatamente o contrário", destaca.
Pelos seus cálculos, o consumo das famílias aumentou 0,8% entre o
quarto trimestre de 2011 e o primeiro trimestre de 2012, período em que a
formação bruta de capital fixo recuou 1,3%. "Deveremos ver uma melhora
nos investimentos no segundo semestre, com os efeitos do afrouxamento
monetário e a esperada saída do papel de projetos do PAC [Programa de
Aceleração do Crescimento], mas o descasamento com o consumo permanecerá
grande".
O crescimento da renda, a redução do desemprego, a expansão do
crédito e o aumento da confiança do consumidor, enumera Alessandra,
sustentam o vigor da demanda. O único fator que podem atenuar o avanço
do consumo, em sua avaliação, é o alto nível de comprometimento da
renda. "A inflação de serviços está desacelerando bastante, o que pode
indicar que as dívidas estão limitando o consumo."
O gargalo da expansão econômica brasileira, para o economista-chefe
do BanifInvest, Mauro Schneider, não está na demanda interna, mas na
oferta. "Com exceção dos serviços, as demais necessidades de consumo
estão sendo atendidas pelos importados. Se quisermos continuar
crescendo, precisamos aumentar nossa produtividade." Mas, até que os
investimentos se transformem em melhor capacidade de produção, lembra
Marcelo Kfoury, superintendente do departamento econômico do Citibank,
eles permanecem como demanda e, portanto, também influenciam a inflação.
O limite do crescimento da demanda, para a economista Fernanda
Consorte, do Santander, será imposto pela inflação. Por enquanto, ela
não espera uma repetição do superaquecimento do passado, mas também não
descarta essa possibilidade. "O que tem permitido uma desaceleração da
inflação é o menor reajuste em administrados e os preços comportados dos
alimentos. Mas, ano que vem, esse quadro deve mudar", diz. Sua projeção
para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de alta
de 6% em 2013.
Fonte: Valor